Educação
A boa educação é a que nos leva a escolher bem.
Como funciona a mente humana?
As partes da mente
Aristóteles nos ensina que nossa mente tem uma parte irracional e uma racional. A parte irracional deseja, tentando nos convencer a procurar por algo, e a parte racional (quando funciona direito) julga nossos desejos e seleciona os que nos farão bem.
Nossa parte racional
Segundo Aristóteles, a parte racional da nossa mente tem algumas capacidades, entre as quais está o discernimento. O discernimento é a capacidade de distinguir entre o bem e o mal. Sem ele nos tornamos viciosos (o pior tipo de pessoa que existe). No caso das pessoas continentes, como elas têm autocontrole, é a parte racional que define suas ações. Por isso, mesmo que tenham desejos maus, seus atos acabam sendo bons.
Nossa parte irracional
A parte irracional pode nos beneficiar ou nos prejudicar.
As pessoas virtuosas são beneficiadas por sua parte irracional, porque alinharam seus desejos à razão. Elas querem ser simpáticas, comer na medida certa, esforçar-se para alcançar seus objetivos e enfrentar os perigos necessários para isso, e é isso mesmo que elas fazem. Por isso costumam ser bem-sucedidas. Portanto, se quisermos nos tornar virtuosos, devemos alinhar nossos desejos à razão.
Já as pessoas incontinentes são prejudicadas por sua parte irracional, porque têm desejos conflitantes e não conseguem controlá-los. Sua tendência é seguir sempre pelo caminho que lhes dê mais prazer e menos sofrimento a curto prazo, mesmo que a longo prazo as torne tristes; enquanto um outro caminho poderia levá-las à felicidade.
O descontrole
Imagine que você queira ir para a direita, mas seu corpo caminhe para a esquerda. Isso pode parecer absurdo, mas quando somos controlados pela parte irracional de nossa mente, contrariamos nossas próprias decisões.
Essa é a situação em que os incontinentes se encontram: querem parar de comer, mas continuam comendo; querem enfrentar o perigo, mas fogem dele; querem ser gentis, mas dizem coisas desagradáveis por impulso. Acabam escolhendo o que é pior para si mesmos, simplesmente porque não se treinaram para fazer as escolhas corretas.
Como funcionam as escolhas?
Desejo
De acordo com Aristóteles, escolha é uma decisão racional de como agir quanto a um desejo. Logo, o primeiro passo para fazer uma escolha é desejar. Ao fazerem isso, aquelas pessoas incontinentes que agem por impulso já passam à ação. De certa forma elas não escolhem agir como agem, porque não chegam a pensar a respeito. Então muitas vezes são perdoadas porque seus erros não foram intencionais. Mas, por agirem sem pensar, podem acabar cometendo erros tão grandes que se torna difícil perdoá-las, mesmo sabendo que não tiveram a intenção.
Pensamento
Quando não somos tão precipitados, depois de desejar, pensamos a respeito pelo menos um pouco: "Será que isso é bom para mim? Será que é bom para os outros? Será que não existe opção melhor?", e, enquanto pensamos, chegamos a algumas conclusões. É quando usamos o discernimento. Depois disso, as pessoas que não têm conflitos agem prontamente.
As pessoas viciosas, que não têm discernimento, frequentemente concluem que será bom fazer algo terrível. É quando escolhem praticar essa ação, e acabam prejudicando a si mesmas ou aos outros. É o que chamamos, em casos extremos, de “cometer um crime por maldade”. São as pessoas mais difíceis de perdoar, porque não se arrependem de seus atos, já que não pensam que fizeram algo errado. As pessoas viciosas não têm dificuldade para agir, pois não têm nenhum conflito moral.
As pessoas virtuosas também agem com facilidade por não terem conflitos morais, mas agem corretamente, pois desejam o que é bom e depois fazem o que desejaram.
Execução
A escolha das pessoas continentes e das incontinentes que não agem por impulso é a mais difícil, porque pessoas com conflitos morais precisam de uma fase extra para chegar a uma decisão.
Elas sabem que querem algo prejudicial para si ou para os outros, e se esforçam para não fazê-lo, mas as continentes conseguem evitar o vício, enquanto as incontinentes são levadas pela compulsão (é o que diferencia as pessoas com sobrepeso que conseguem emagrecer das que não conseguem).
Ou sabem que querem algo benéfico para si ou para os outros, e se esforçam para fazê-lo, mas as continentes se esforçam o bastante e as incontinentes não (é o que diferencia as pessoas bem-sucedidas em suas atividades daquelas que estão sempre comentando: “Eu até queria fazer isso, mas exige muita dedicação!”).
Como fazer boas escolhas
Para fazer boas escolhas, portanto, Aristóteles nos ensina que precisamos nos educar para três coisas: (1) distinguir entre o bem e o mal, (2) ter desejos corretos e (3) controlar nossas próprias ações.
Tabela
Pessoa | Desejos | Pensamento | Execução | Resultado |
---|---|---|---|---|
Viciosa | Bons e maus | Não quer controlar-se | Faz tudo que quer | Prazer |
Incontinente | Bons e maus | Tenta controlar-se | Faz tudo que quer | Arrependimento |
Continente | Bons e maus | Tenta controlar-se | Faz o que decide | Virtude |
Virtuosa | Bons | Não precisa controlar-se | Faz tudo que quer | Felicidade |
Como devemos nos educar?
O princípio da educação
O objetivo da vida é a felicidade, que vem em grande parte das nossas escolhas. E a maior parte das escolhas erradas deve-se aos prazeres enganosos, que nos afastam dela (vemos essa tendência claramente nas crianças e nos adolescentes, que se deixam enganar facilmente pelo prazer).
Portanto, o objetivo da educação deve ser capacitar-nos para fazer boas escolhas, e a boa educação é a que nos leva a escolher bem. Para isso precisamos aprender a desejar os prazeres certos, ou acabaremos entre os adultos que agem como crianças, trocando qualquer perspectiva de futuro por prazeres momentâneos porque ainda não aprenderam a diferença entre o prazer e a felicidade.
Os hábitos
Aristóteles nos ensina que a melhor forma de evitar que nossos prazeres entrem em conflito com nossa própria felicidade é aprendendo a sentir prazer com as coisas certas, o que fazemos através do hábito (afinal, a virtude vem do hábito). Sentir prazer com as coisas certas também nos ajuda a fazer bem o que devemos, pois o prazer favorece a concentração, enquanto o sofrimento a prejudica.
O melhor é adquirir os hábitos certos já na infância, sob a orientação de nossos responsáveis, porque no princípio da vida ainda não temos aquele orgulho de quem pensa: “Eu fui assim a vida toda! É claro que não vou mudar agora”, mas um adulto com humildade suficiente, por mais estragado que esteja, ainda pode corrigir seus maus hábitos até tornar-se virtuoso, desde que esteja disposto a esforçar-se o bastante.
O descanso
Para aprendermos a ter desejos corretos e alinharmos nosso caráter à virtude, precisamos entender que o esforço e a diversão fazem parte de uma vida saudável, e administrar nosso tempo e energia para nos dedicarmos ao que seja necessário (estudar, trabalhar, ajudar os outros etc.) e só depois, quando já tivermos nos esforçado bastante, nos entreter com algo que não exija tanto esforço.
De acordo com Aristóteles, a diversão deveria ser benéfica para todos. O problema é que as pessoas viciosas e as incontinentes passam tanto tempo se divertindo, que não sobra tempo ou energia para progredirem intelectual, moral ou mesmo profissionalmente. Os virtuosos e os continentes, ao contrário, primeiro esforçam-se para cumprir suas obrigações, e depois vão fazer o que consideram divertido, porque isso os ajuda a se recuperarem tanto física quanto mentalmente.
O resultado da boa educação
Nenhum ser humano nasce já sendo virtuoso, mas todos nascemos com o potencial de nos tornarmos virtuosos. Basta que nos esforcemos para adquirir os hábitos corretos, e o prazer vem com o tempo. Afinal, esses hábitos não são leis que a razão impõe contra nossa natureza. A razão serve justamente para descobrir os hábitos que nos farão felizes, e a força de caráter, para evitar as armadilhas que nos impedem de revelar nosso verdadeiro potencial.
As pessoas que adquirem os hábitos corretos tornam-se benéficas para si mesmas e para as demais, e nem sequer precisam de leis para viver em harmonia, porque o bom senso já lhes basta. As outras, infelizmente, por terem dificuldade para agir corretamente, tornam necessário um grande número de leis. É aí que termina o papel da educação, e começa o da justiça.